Comida anticâncer
Pesquisa mostra que os vegetais afastam a ameaça de vários tumores. Sem
contar que, ao incrementar as porções de frutas e hortaliças no prato, sobra
menos espaço para a gordura e ela tem tudo a ver com o surgimento da doença
por Cida de Oliveira | foto Alex Silva
Não tire conclusões precipitadas: os alimentos destas páginas não são
milagrosos. Mas a ciência da nutrição, que investiga sua ação anticancerígena,
constata que eles de fato têm efeito preventivo. Vários levantamentos
estatísticos apontam, e não é de hoje, que nas pessoas habituadas a devorar
vegetais os casos de câncer são mais raros, garante o gastrenterologista Dan
Linetzky Waitzberg, professor da Universidade de São Paulo. Mas, na hora do ver
para crer, isso só era observado em tubos de ensaio, nos chamados testes in
vitro. Só agora é que os pesquisadores passaram a enxergar o mecanismo
antitumor de vários nutrientes dentro de organismos vivos no caso, cobaias. É
um belo avanço.
Na Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, por exemplo,
concluiu-se que o sulforafane, presente na família dos crucíferos couves,
brócolis, repolhos , é capaz de brecar o avanço do câncer colorretal em animais
de laboratório. Já em Taiwan, cientistas da Universidade Nacional Chung Hsing
testaram o licopeno em animais, nos quais provocaram de propósito um câncer de
fígado igual ao que acomete os seres humanos. O resultado? O pigmento que dá o tom
vermelho ao tomate e a frutas como a goiaba simplesmente barrou a temida
metástase, ou seja, impediu que as células malignas se espalhassem pelo corpo.
A essa altura, você deve estar se perguntando: por que certos
nutrientes funcionam contra um tipo específico de tumor mas são praticamente
inertes contra outros? Nem os cientistas têm respostas prontas, embora
arrisquem algumas hipóteses. Uma delas é a facilidade de alguns tecidos para
acumular determinadas substâncias, criando verdadeiras reservas. É o caso do
licopeno, o tal pigmento vermelho dos vegetais. Os pesquisadores notam que ele
tem uma afinidade especial com os tecidos da próstata e das mamas, ficando
concentrado bem ali, enquanto passa depressa por outras partes do corpo talvez
sem o tempo necessário para agir. O resveratrol da uva e do vinho, por sua vez,
tende a ficar no plasma do sangue e nos tecidos do sistema urinário. Já
compostos fenólicos, como o allium, que está na cebola, no alho e na cebolinha,
fariam escala no estômago e no intestino, atuando em diferentes etapas do
processo que leva ao câncer nesses órgãos. No entanto, não movem uma palha
contra tumores em outras regiões.
Pode parecer confuso e é. Não tente decorar quanto deve comer disso ou
daquilo, como se a travessa à mesa fosse um vidro de remédio. O grande mérito
de tantas pesquisas é ensinar aos médicos, inclusive que um cardápio adequado
(leia-se bem colorido também) pode prevenir 30% dos casos de câncer, incluídos
aí tumores de boca, laringe, faringe, estômago e intestino, muito freqüentes na
população brasileira. Já é um feito e tanto se a gente pensar que, não faz
muito tempo assim, ninguém achava que havia um caminho seguro para prevenir
essa doença muito menos desconfiava que ele estaria no prato. Hoje se tem
clareza da importância de comer frutas, verduras, legumes e peixes, limitando
ao mesmo tempo as porções de carnes vermelhas, sal e embutidos, resume Dan
Linetzky Waitzberg. Segundo Sueli Couto, nutricionista do Instituto Nacional de
Câncer, o Inca, sediado no Rio de Janeiro, a questão não é quantidade de
vegetais, mas regularidade. Tem de comer sempre, declara. No mínimo, cinco
porções diárias, preferindo sempre grãos integrais aos refinados.
Do mesmo modo que sobram evidências de que vitaminas, minerais, fibras e
outras substâncias presentes em frutas e hortaliças podem barrar o avanço de
tantos tipos de tumor, há provas suficientes para incriminar o álcool, os
embutidos e as gorduras, especialmente as das carnes vermelhas. Estas
ressalve-se têm também seu lado bom, fornecendo proteínas de excelente
qualidade, ferro, zinco e vitaminas B12. Não se trata, portanto, de baní-las do
menu. A recomendação é reduzir a ingestão para duas porções semanais, diz Sueli
Couto, do Inca. Ela, no entanto, insiste: pior do que comer carne sempre, é não
comer salada nunca.
Além de repletas de substâncias protetoras, as saladas tornam a
refeição mais light. E, embora não haja consenso em torno do assunto, a gordura
corporal vem sendo examinada com desconfiança. O peso extra, dizem cientistas
como os que observaram isso em ratos, na Universidade do Texas, nos Estados
Unidos contribui para reações inflamatórias dentro do organismo. Até há pouco
tempo, essas reações só eram associadas a doenças cardiovasculares. Hoje se
sabe que elas podem aumentar em 30% as chances de um câncer aparecer, afirma
Alfredo Halpern. Portanto, a melhor dieta anticâncer é aquela leve, bem leve.
Vai um suplemento aí?
Diga não se você adota uma dieta balanceada. A menos, claro, que um
médico ou um nutricionista recomende, avaliando bem os seus hábitos à mesa. Sem
esse olhar, você corre o risco de engolir, em cápsulas, altas doses de um
nutriente em detrimento de outros. E isso, por sua vez, pode acabar com o
balanceamento das substâncias protetoras no organismo. Ou seja, você fica sem
escudo contra o câncer.
Sinal verde
Ele se acende principalmente para alimentos cheios de fibras e
substâncias antioxidantes
Câncer de mama
As fibras, abundantes na melancia, por exemplo, são poderosas contra
esse tipo de tumor. Uma das explicações é que elas passam mais lentamente pelo
aparelho digestório, o que aumenta a saciedade e, por tabela, diminui a vontade
de cair de boca em açúcares e gorduras. O risco de quilos a mais, assim,
despenca. O excesso de peso tem ligação estreita com o aparecimento da doença
nas glândulas mamárias, sobretudo em mulheres que já passaram pela menopausa,
afirma o endocrinologista Alfredo Halpern, do Hospital das Clínicas de São
Paulo. Entre outros motivos porque, quando há muita gordura, o corpo tem
matéria-prima à vontade para fabricar hormônios que alimentam o tumor. Bem, se
as frutas da dieta têm muitas fibras e ainda por cima são vermelhas como a melancia
do nosso exemplo , tanto melhor. O consumo regular de licopeno, o pigmento
vegetal dessa cor, anda cada vez mais associado à baixa incidência desse
câncer.
Também são fortes os sinais de que os polifenóis estão ligados à
proteção das mamas. Daí a recomendação dos cientistas de que as mulheres
consumam toda semana suas fontes uvas vermelhas, amora, morango, cereja, vinho
tinto... Quanto às isoflavonas, célebres componentes da soja, elas também atuam
pra valer contra esse tumor. Na última década, diversos estudos, feitos
sobretudo com populações orientais, confirmaram o elo entre o alto consumo do
grão e a baixa incidência de câncer de mama e atenção de próstata também!
Câncer de próstata
A abóbora, lado a lado com a cenoura, é famosa pela concentração de
betacaroteno. Afirmar que essa substância protege contra os tão (mal)falados
radicais livres não é chover no molhado. Ela ajuda mesmo a restaurar o DNA de
células danificadas por agentes químicos, físicos ou biológicos. Quando o dano
no material genético de nossas células acontece, abre-se o caminho para a
reprodução desenfreada de exemplares defeituosos eis o câncer. É possível que o
betacaroteno aja positivamente contra muitos tipos de tumor, mas um trabalho
recente da respeitadíssima Universidade de São Paulo avalizou suas benesses
especificamente para a glândula masculina. Outros estudos apontam que o tomate,
o feijão, a lentilha, a ervilha, as uvas vermelhas, as amoras e a soja também
reforçam as defesas dos homens contra esse câncer mas, aí, tudo o que a ciência
conhece é a relação entre o hábito de comê-los e o aparecimento mais raro dessa
doença, sem entender direito qual seria a relação direta.
Câncer colorretal
Cientistas da Universidade de Nova Jersey, nos Estados Unidos, provaram
que é possível reduzir um câncer colorretal já existente consumindo verduras
crucíferas, como a couve-manteiga e sua prima couve-flor. Fazem ainda parte da
família o repolho e os brócolis. Os pesquisadores viram essa redução com os
próprios olhos ao menos em ratos. E atribuem o efeito a um componente desses
vegetais chamado sulforafane. Outra pesquisa com 520 mil europeus apontou uma
queda de 40% no risco dessa doença entre aqueles que não deixavam faltar no
prato, uma vez ao dia, pelo menos uma dessas crucíferas, relata Benedito Mauro
Rossi, oncologista do Hospital do Câncer, em São Paulo. O efeito do
sulforafane, aliás, parece potencializado à medida que aumentam os teores de
fibras no cardápio, quando comemos outras folhas, como rúcula ou espinafre, e
desfrutamos, por exemplo, de uma laranja como sobremesa.
Bebida Alcoólica
Diversos estudos associam álcool ao câncer de boca, esôfago, fígado,
reto e, muito possivelmente, ao de mama também. As evidências tornaram-se mais
fortes dos anos 1990 para cá. O Instituto Nacional para a Pesquisa do Câncer,
nos Estados Unidos, recomenda que os homens ingiram, no máximo, dois drinques
por dia. Já as mulheres, apenas um. Os cientistas ainda estão pesquisando como
o álcool causa a doença. No caso do aparelho digestivo, fica mais claro: a
agressão é por meio do contato direto com as mucosas. De um jeito ou de outro,
o excesso de bebida alcoólica danifica o DNA, aumentando as chances de surgirem
células malignas.
Sal em excesso
Ele já carrega má fama porque faz o organismo reter mais água do que
deveria, contribuindo, assim, para o aumento da pressão arterial. Só que, ainda
por cima, irrita a mucosa do aparelho digestivo de tal maneira que provoca
lesões capazes de evoluir para um câncer, avisa Sueli Couto. Segundo ela, só
afastar o saleiro da mesa não basta. Lembre-se de que a maior concentração do
sal está nos alimentos industrializados. Então, evite ao máximo molhos,
condimentos, macarrões instantâneos e comida pronta em geral. Prefira, de
longe, as preparações caseiras.
Fuja dos embutidos
Salsicha, salame, presunto e mortadela outras armadilhas armadas no
prato são, de longe, os maiores vilões. Não bastasse serem produzidos com
carnes vermelhas geralmente muito gordas, ainda levam na fórmula aditivos
químicos chamados nitratos, que, no estômago, podem se transformar em nitritos.
Estes, por sua vez, se convertem em nitrosaminas, verdadeiros agentes
cancerígenos, perigosos sobretudo para o estômago e o esôfago. E atenção: até
as carnes brancas perdem suas vantagens nutricionais quando transformadas em
embutido. Como recebem os tais nitritos e são defumadas, também se tornam
nocivas, alerta Benedito Mauro Rossi, oncologista do Hospital do Câncer, em São
Paulo.
Fonte:
http://saude.abril.com.br/edicoes/0298/nutricao/conteudo_278760.shtml