Um dos mais renomados oncologistas do país, Paulo Hoff
avisa: a doença deixou de ser uma sentença de morte
por Theo Ruprecht • design
Laura Salaberry • foto Silvia Zamboni
Quando a palavra tumor vem à mente, não é incomum associá-la
ao medo que os tratamentos contra esse mal despertavam. Não sem motivos. Há
cerca de 20 anos, eles eram mais agressivos e sua taxa de sucesso, baixa. A
situação atualmente é outra, mas o tabu persiste. É para dar cabo desse temor
infundado que Paulo Marcelo Hoff, diretor-geral do Centro de Oncologia do
Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, luta todos os dias. Esse também é um dos
objetivos do livro Como Superar o Câncer (Editora Abril), de autoria de Hoff,
ao lado de um time de especialistas do hospital. Nesta conversa, o oncologista
deixa claro que há cada vez mais saídas para a doença — e que conviver com ela
não é mais um pesadelo interminável.
SAÚDE - O que mudou no combate ao câncer de alguns anos para
cá?
PAULO HOFF - Felizmente, muita coisa. Décadas atrás, grande
parte dos pacientes nem recebia a opção de se tratar. Eles eram mandados de
volta para casa. De lá para cá, houve um aumento na expectativa de cura e um
grande crescimento na sobrevida dos indivíduos com tumores não curáveis. Talvez
um dos maiores avanços tenha sido o desenvolvimento de medicamentos que
minimizam os efeitos colaterais. No início dos anos 1990, um paciente tratado
com o quimioterápico platina tinha que ficar internado. Esperava-se que ele
vomitasse de 20 a 30 vezes por dia e ficasse desidratado. Hoje a pessoa vem até
o ambulatório, toma sua platina, um pouco de soro e aí vai embora. O que mudou?
As medicações de apoio, que trouxeram um novo panorama e possibilitaram uma
abordagem mais agressiva contra o câncer, proporcionando resultados melhores.
Tudo isso modificou a percepção que se tem da doença.
O senhor fala do tabu com o câncer…
Eu não sei se na sua, mas na minha família não se falava
essa palavra. Tenho uma tia que chamava o câncer de "a coisa" ou
"aquela doença".
E o tabu com a palavra sobrevida?
É impossível determinar a expectativa de vida de uma pessoa
com câncer, seja ele qual for. O problema é que um grande número de pacientes
quer saber quanto vai viver. Então, o médico acaba sendo forçado a fazer
estimativas com base em estudos que servem para ver o benefício de um
tratamento específico na população em geral. E essa resposta pode não agradar.
Mas duas décadas atrás a expectativa de sobrevida para parte dos tumores
avançados era inferior a um ano. Hoje é frequente que ela esteja acima dos três
— isso nos casos avançados. E lembrando que, do ponto de vista individual,
alguns vão ficar vivos até dez anos depois.
É por essa razão que o câncer passou a ser considerado uma
doença crônica?
Sim. Mesmo quando não há possibilidade de cura, o indivíduo
tende a viver por um longo período. Sempre lembro aos meus pacientes quando
eles têm dúvidas se viverão bem com um câncer que, em 1945, o presidente
americano Franklin Roosevelt morreu por complicações de pressão alta, hoje algo
impensável. Mas é raro conseguir curar a hipertensão. Uma vez diagnosticada com
o problema, a pessoa vai se tratar pelo resto da vida. Mesmo assim, ela nem
considera ter uma doença, de tão controlada que está. Não chegamos a esse nível
com relação ao câncer, mas já avançamos muito. A vida hoje, para quem tem um
tumor, é consideravelmente melhor do que antes.
O senhor está otimista com o futuro do combate à doença?
Há muitas novidades surgindo. Existem mais de 800 remédios
em fase de pesquisa. Se uma fração deles for efetiva, o número de medicamentos
disponíveis terá mais do que dobrado. Uma das coisas que mais esperamos é uma
maior individualização do tratamento. O aumento da quantidade de informações e
da compreensão sobre o câncer fez crescer o número de alvos das terapias, e
isso deve levar a um benefício para os pacientes com as mais diversas
particularidades.
As pessoas se confundem com tantas informações sobre o
câncer?
Isso é muito comum, principalmente quando uma celebridade
tem a doença. Todos querem saber por que o famoso pode se submeter a um
procedimento e eles não. O que escapa é que as situações nunca são iguais.
Existem centenas, ou talvez milhares, de opções terapêuticas, que dependem de
outras centenas de possíveis apresentações do tumor. Por isso o livro Como
Superar o Câncer é tão importante. Além de satisfazer a curiosidade, ele embasa
o paciente, seus familiares e amigos para uma discussão mais compreensiva com o
médico.
Fonte: http://saude.abril.com.br/edicoes/0341/medicina/novo-olhar-sobre-cancer-640601.shtml